Motivação:

Quando decidimos estabelecer que este projeto fosse acessível ao grande público da internet, sabíamos da quantidade de pessoas que poderíamos atingir. Dizemos poderíamos porque somos cautelosos e humildes, uma vez que certamente reconhecemos a gigantesca oferta: sites de literatura de inquestionável qualidade pululam no vale fértil das redes sociais, e outros, não tão preocupados com o selo qualitativo, seguem logo atrás na semeadura das letras nesta terra de ninguém - não em menor número, paradoxalmente. A literatura, por incrível que pareça, se alastra não como uma bela cultura vegetal, como uma bisonha erva daninha, porém, procurando absorver fama mineral que alimente o ego seco da raiz. Eis no que diverge o nosso trabalho e o desta horda de escritores que têm aterrorizado os dias com seus autógrafos, espadas e lanças: não necessitamos de visibilidade. Não faz a mínima diferença o número de pessoas que visualizará este blog, faz diferença apenas o fato dele existir. A intenção é ofertar um registro fiel dos dias de um homem cuja existência foi dedicada à busca da beleza, da suavidade, da paz, do amor em todas as suas incontáveis formas, ainda que tenha sido o conflito a via pela qual viajou durante a maior parte do tempo. Venkon Sinjoro Serena reconhece em si mesmo uma expressão ímpar na literatura, ainda que este fato não mereça nem celebração nem repúdio: abre um caminho entre as matas, uma faca de prata nas mãos evoca luz, eis uma estrada! Ali segue o poeta, sozinho...

v. s. s.

sexta-feira, 18 de julho de 2014

Quantos pássaros passaram
Por um homem distraído
Que pensava em outras coisas
Quaisquer e não se deu conta
Quantos pássaros passaram?

Há uma memória anterior
Às memórias todas
Das pessoas todas
Que tem memória:
Quantos pássaros passaram
Não é um número perdido,
Todos os números são exatos,
Todos os números sabem bem
Onde estão – quantos pássaros
Passaram é a mesma coisa
Que vi escondido em um jardim
Quando eu era pequeno
E já não me lembro... Quantos
Pássaros passaram é as coisas
Que eu disse e não recordo,
É o que comi na manhã
De doze de janeiro de mil
Novecentos e noventa e oito
E não recordo. São as lembranças
Que não tenho, mas tenho:
Estão elas guardadas todas
Em um lugar muito bonito
Que é a onisciência da vida.

Quantos pássaros passaram
E eu não me dei conta?
Simplesmente não sei.
Esta é a poesia mais madura
Que eu já te escrevi... Tens tu
Os teus pássaros também, os que tu
Te lembras, os que tu não te recordas...

A questão agora, meu amor, meu primeiro
Amor consumado, não são os pássaros
Que recordamos ou aqueles que esquecemos:
Importa somente a revoada toda, toda ela
Um conjunto, pura, indomada, escrita à mão
Por alguém que sabe de todos os destinos
Migratórios das memórias...

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