Motivação:

Quando decidimos estabelecer que este projeto fosse acessível ao grande público da internet, sabíamos da quantidade de pessoas que poderíamos atingir. Dizemos poderíamos porque somos cautelosos e humildes, uma vez que certamente reconhecemos a gigantesca oferta: sites de literatura de inquestionável qualidade pululam no vale fértil das redes sociais, e outros, não tão preocupados com o selo qualitativo, seguem logo atrás na semeadura das letras nesta terra de ninguém - não em menor número, paradoxalmente. A literatura, por incrível que pareça, se alastra não como uma bela cultura vegetal, como uma bisonha erva daninha, porém, procurando absorver fama mineral que alimente o ego seco da raiz. Eis no que diverge o nosso trabalho e o desta horda de escritores que têm aterrorizado os dias com seus autógrafos, espadas e lanças: não necessitamos de visibilidade. Não faz a mínima diferença o número de pessoas que visualizará este blog, faz diferença apenas o fato dele existir. A intenção é ofertar um registro fiel dos dias de um homem cuja existência foi dedicada à busca da beleza, da suavidade, da paz, do amor em todas as suas incontáveis formas, ainda que tenha sido o conflito a via pela qual viajou durante a maior parte do tempo. Venkon Sinjoro Serena reconhece em si mesmo uma expressão ímpar na literatura, ainda que este fato não mereça nem celebração nem repúdio: abre um caminho entre as matas, uma faca de prata nas mãos evoca luz, eis uma estrada! Ali segue o poeta, sozinho...

v. s. s.

terça-feira, 15 de julho de 2014

Mário de Sá-Carneiro, amigo
Que eu não conheci: eu sou como tu,
Me sinto como tu te sentias, quero algo
Que está além de todas as possibilidades.
Mário de Sá-Carneiro, grande entre grandes,
Eu sou como tu, amigo que não conheci:
O que me falta ainda são os cinco frascos
De estricnina e um bairro tão elegante
Quanto Montmartre para poder morrer.

Ah, meu amigo, eu quero tentar, como quero!
Sei, porém, que muitos tentaram como eu não tento:
Perderam, estão todos muito distantes de tudo
Aquilo que conhecemos agora, tentaram!
As vísceras, intuitivas, Mário, palpitantes:
Todos eles sabiam que deus guarda cinco
Frascos de estricnina para cada membro
Desta nossa raça de trágicos, todos eles sabiam,
Principalmente os poetas sabiam, como tu sabias
E eu sei... Ah, Mário, a lírica é uma desnecessidade
Que não fala nada com nada... A ninguém importa
A poesia que não seja a poesia de sua própria vida
- Ou a poesia de gigantes em quem, sem outras possibilidades,
Procuramos nos espelhar.

E tudo isto é falso como a maquiagem de uma puta triste:
Uma hora serão removidas todas as cores que a luz dá,
A face da tristeza há de se converter resplandecentemente
Na face da verdade que tanto amamos sem conhecer.

Mário, amigo querido que nunca conheci:
Em breve nos conheceremos e, entre goles alegres
De qualquer bebida amarga que tu gostes e que me mate,
Me contarás que houveram também alegrias
Enquanto vivias.

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